terça-feira, 8 de dezembro de 2009

CineContexto


RESENHA DO FILME O ANO EM QUE MEUS PAIS SAÍRAM DE FÉRIAS:
Uma mistura de puberdade, futebol e ditadura militar


ANO EM QUE MEUS PAIS SAÍRAM DE FÉRIAS, O. Direção: Cao Hamburger. Roteiro: Cláudio Galperin, Bráulio Mantovani, Anna Muylaert e Cao Hamburger, baseado em história original de Cláudio Galperin e Cao Hamburger. Brasil: Buena Vista Internacional, 2006.


O filme O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias é o segundo longa metragem do diretor Cao Hamburger. Sua primeira experiência foi com o filme Castelo Rá-Tim-Bum, direcionado para o público infantil, já na segunda experiência, ele fala de infância para adultos.

Ambientado em 1970, no filme O Ano em Que Meus Pais Saíram de Férias a ditadura militar é suavemente retratada como pano de fundo sob o olhar inocente de um garoto iniciando a puberdade. Mauro (Michel Joelsas) sai de Minas Gerais e é deixado pelos pais no bairro paulista do Bom Retiro para ficar com o avô enquanto eles saíam de “férias”. Entretanto, enquanto o garoto fazia o percurso até o seu novo lar, seu anfitrião morre, o neto só fica sabendo depois de algumas horas de espera na porta da casa, recebe a notícia por um visinho judeu, do qual mais tarde se torna grande amigo, esse é o plot poit da narrativa.

Os pais de Mauro são exilados políticos, durante toda a narrativa há ícones que denunciam a tensão política militarista. As circunstâncias também tornam o menino um exilado, entre judeus, árabes, italianos, ele vai se adaptando a novos costumes e crenças religiosas e como via de escape, enquanto espera um telefonema dos pais, assiste aos jogos da copa do mundo de futebol e descobre a vocação para ser goleiro.

Apesar dos novos amigos, despertar a paixão da amiguinha e se apaixonar por uma garota mais velha, Mauro vive os conflitos da solidão longe dos seus pais e a ansiedade pela volta deles, marcada para o dia em que os jogos começassem e os telespectadores vivenciam a mesma aflição – os pais voltam ou não? Será que de exilados viram desaparecidos políticos?

Vale ressaltar que a temática do filme não é a ditadura militar e sim como a mesma pode influenciar na vida de uma criança, a existência é o que permeia toda a subjetividade do roteiro. O retrato do filme é fiel ao período que representa, objetos da época, a arquitetura foi reconstituída e até as cores contribuíram para ambientar as cenas, o pastel é tão melancólico quanto à ausência dos pais de Mauro. Há momentos em que a câmera fica aberta, afastando-se do objeto, esse movimento remete a imensidão do mundo infantil, em contra partida, ora acontece o contrário e a gravação em dolly in, da a impressão de que vamos mergulhar no interior de Mauro, na mais profunda escuridão da saudade.

O mundo infantil é complexo, sobretudo durante a passagem para a puberdade, o que requer um olhar sensível dos educadores, o filme O ano é uma boa indicação para turmas que estão nessa fase, não só pela beleza, mas também para refletir como a nossa existência está mesclada por diversas nuances de acontecimentos além do nosso controle. Nessa perspectiva é necessário que o professor contextualize, trazendo o pano de fundo – a ditadura militar – para o primeiro plano, para que os alunos possam criar sentido em relação à existência de Mauro. Para dar sentido a própria existência deles é interessante considerar a realidade vivenciada na localidade em que vivem. Por exemplo, na comunidade em que moro, localizada no sertão baiano, a longos períodos de seca, em que o pai de boa parte dos alunos vão a busca de trabalho em outras partes do país, como isso implica na existência deles.

Outro ponto alto do filme é a via de escape de Mauro, a Copa do Mundo, o espírito nacionalista, também era uma fuga para os adultos, dentre outras coisas. E hoje o representa a Copa do Mundo para o povo brasileiro, será coincidência ser no mesmo ano das políticas presidenciais brasileira? Dependendo da maturidade dos educandos, essa questão gera uma boa discussão acerca da política nacional.

Enfim o filme deve ser visto sob o primeiro olhar, o de uma criança que está vivendo entre o drama da perca e a felicidade da vitória – os pais e o futebol. Ao entrar na sala de aula cuidado com a mera didatização dessa obra prima.

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