terça-feira, 27 de outubro de 2009

CineContexto - As Horas


(Re)pensando o papel da escola, é intrigante a questão – como se ensina a ser menina – o segundo encontro da atividade CineContexto e o GECI As Horas tinham como objetivo em suas ementas essa discussão. Entretanto a polêmica no GECI acerca do homossexualismo ofuscou o foco do encontro, como a identidade feminina é construída na escola e pela sociedade, bem como os fatos histórico que contribuíram para a formação de cada protagonista que compõem o enredo de As Horas do roterista David Hare, que baseou-se no livro que tem o mesmo título, do autor Michael Cunnigham que inspirou-se na obra Mrs. Dalloway de Virginia Woolf.
É um filme fantástico para pensar na construção da narrativa – situação inicial, conflito (plot point, ponto de virada), desenvolvimento, clímax e desfecho – segue a mesma seqüência da narrativa textual, esse modelo é inspirado em Aristóteles.
O filme As Horas apresenta três narrativas que acontecem em tempos e espaços diferentes. Com a protagonista Mrs. Virginia Woolf, voltamos a 1920, em Richmond, subúrbio de Londres. Período pós I Guerra Mundial, essa personagem é real, as outras duas são fictícia, mas um retrato da realidade de cada época em que viveram. Mrs. Laura Brawn viveu em 1950, em Los Angeles, pós II Guerra Mundial. E Mrs. Clarissa Lungh, nossa contemporânea, 2000, em Nova Iorque, seu tempo é marcado pela luta contra a AIDS. Todas vivem uma guerra interior em relação as suas identidades, lutam contra a violência contra a mulher que aparece de forma sutil, mas devastadora, o roubo da suas identidades. As duas primeiras assumiram os papéis dos homens nas fábricas e como chefes na família. Depois lhes restam apenas serem boas donas de casa, mães e esposas para agradarem seus heróis que voltaram da guerra. Clarissa passa a viver para o amigo aidético, embora aparentemente bem resolvida é mais a frágil das três, livre e presa ao mesmo tempo, amarrada ao passado, perdeu sua identidade.
Nos dois períodos pós-guerras mundiais, ocorreram os movimentos feministas. A própria Virginia Woolf liderou o I movimento e influenciou inúmeras mulheres com sua obra Mrs. Dalloway, o movimento foi criticado por ser radical em relação a ser dona de casa, mãe e esposa. O II movimento em 1960-1970, liderado por Betty Friendan, em contraste ao I defendia que aquelas mulheres que queriam ser esposa, mãe e dona de casa, deveriam ser, desde que escolhessem isso. A crítica desta feita foi por alegarem que Friendan defendeu os interesses das mulheres de classe média, as de classe baixa não tinham direito à escolha. Friendan chamou a crise de identidade das mulheres de “mal sem nome” ao referir-se à depressão, daí seu livro A Mística Feminina. Hoje a mulher além de esposa, mãe, dona de casa, profissional, tem que ser acima de tudo mulher, escrava da mídia.
Mas o que essa mística feminina tem a ver com a minha prática como professora, como ensino às meninas a serem mulheres? A repressão é constante, nas brincadeiras, algumas concebemos como sendo exclusiva de um dos sexos, como uma colega relatou já na educação infantil, os brinquedos são divididos, para homens e mulheres, os quais não brincam juntos. A forma de sentar, reclamamos as meninas que se sentam de qualquer jeito, que falam algumas palavras, principalmente as relacionadas a sexualidade. Menino não chora, logo menina é frágil. Sem falar na literatura, os contos de fadas que retratam a mulher sempre a serviço do homem. Enfim confesso que inconscientemente, simplesmente reproduzia o modelo vigente de ser mulher, embora não concorde com padrões, não sou uma radicalista, mas também, não sou obediente em tudo que a sociedade machista dita. O ponto em questão é, nunca tinha pensado a identidade feminina como currículo escolar.

CineContexto


CRÍTICA AO FILME CINEMA, ASPIRINAS E URUBUS:
UMA PROPOSTA EDUCACIONAL

CINEMA, ASPIRINAS E URUBUS. Direção: Marcelo Gomes. Roteiro: Marcelo Gomes, Paulo Caldas e Karim Aïnouz. Brasil: Imovision, 2005, 90 min.

O filme Cinema, Aspirinas e Urubus é o primeiro longa metragem do cineasta pernambucano Marcelo Gomes. A idéia surgiu no convívio familiar, seu tio-avô Ranulfo Gomes relatava acerca de um alemão que nos anos 40 aventurou-se pelo nordeste brasileiro vendendo aspirina, remédio vindo da sua terra natal, Alemanha. Esse é o pano de fundo do filme.

Marcelo Gomes homenageia o tio, sua fonte de inspiração, por batizar um dos protagonistas com o seu nome – Ranulfo (o ator baiano João Miguel), o qual vivencia o nordestino que contracena com o alemão Johann (Peter Ketnath). Essas duas personagens se encontram na estrada e aventuram-se, caatinga adentro, em um caminhão, caracterizando o filme como road-movie. Cada um foge da sua identidade, mas ambos buscam sua identificação. A composição individualizada desses dois homens de mundos tão diferentes, mas que buscam os sonhos, é o patho que os movem e por fim os separam.

A verossimilhança compõe a unidade dramática do filme, até mesmo a ausência de um fundo musical é um componente básico. Pois, por meio do silêncio, há a denuncia à solidão das personagens, a angústia de ambas frente à situação sócio-política que vivem. Enfim, torna as cenas mais marcantes. Este filme é um marco no cinema nacional, que está amadurecendo gradativamente, caracteriza-se como cinema popular de arte. Marcelo Rocha brinca com o olhar do telespectador, a mudança de dolly out para dolly in, causa estranheza. Como boa parte do filme se passa dentro do caminhão os ângulos são focados em dolly in, ou seja, com a câmera próxima do objeto.

Os anos 40 marcam a temporalidade dos acontecimentos, o mundo em guerra, o Brasil se alia aos Estados Unidos da América, inimiga da Alemanha. A produção de borracha se intensifica, o que demanda um número maior de mão de obra não qualificada. Diante da demanda nos seringais da Amazônia e da seca no Nordeste, esse foi o destino de muitos nordestinos, entretanto trabalhar para fornecer borracha para os EUA era só uma extensão da miséria vivida anteriormente. Com esses últimos acontecimentos, a aspirina fica proibida no Brasil. O tempo dramático muda a cada cena, o rádio que anuncia as notícias locais e mundiais é um ícone que simboliza a cadência, sobretudo de Johann, que traz a tona várias lembranças. Na resolução, aparece a figura do urubu, o qual é permeada de um subtexto, que nos leva a algumas leituras, dentre elas, uma alegoria a resistência do povo nordestino ao lutar pela sobrevivência.

Essa obra prima de Marcelo Gomes, é um retrato do sertão, os figurinos, a linguagem, não sobressaem nas cenas, mas as tornam mais reais, sem apelação. A escolha de atores que nasceram no próprio cenário que representam, inclusive o alemão, deu um tom de originalidade na composição das personagens. O cineasta foi feliz ao condensar em 90 minutos um roteiro que perpassa por diferentes espaços, entrelaçando-os de forma clara, compreensível, entretanto sem perder de vista a estética fílmica do Cinema Novo.

É um filme para assistir pelo simples prazer de apreciar uma obra de arte com boa qualidade. Mas, também, pode ser indicado para estudos mais específicos em algumas áreas de conhecimento. A sua ethos enriqueceria as discussões nas aulas de Filosofia, além disso, as questões relacionadas à identidade, identificações e preconceito, poderiam render o bate papo com os alunos. Independente da disciplina é preferível que o filme seja exibido para educandos das séries finais do Ensino Fundamental – 7ª e 8ª séries – há algumas cenas picantes.

Nessas séries indicadas os professores de Língua Portuguesa podem analisar a linguagem regional e/ou a produção de sinopse, resenha crítica, propaganda, visto que o filme é parte da nossa realidade. A linguagem fílmica não pode passar despercebida ao estudar esses gêneros textuais nesse contexto. Antes de assistir o filme, levantar hipóteses a partir de uma cena ou de um trecho de resenhas já produzidas. Isso é válido para as outras disciplinas também, pois cria expectativa e contribui para formação de uma platéia mais receptiva.

História não poderia ficar de fora, todo o conteúdo do filme é histórico. O diferencial entre o filme e a maioria dos livros Didáticos de História é a forma como a temporalidade é apresentada, os fatos locais, no Brasil e no mundo são simultâneos e se cruzam. As questões econômicas aparecem numa intensidade, sob a influencia da globalização, que possibilita um trabalho interdisciplinar com Geografia. Vale ressaltar que a interdisciplinaridade pode ser feita entre todas as disciplinas mencionadas, cabe ao professor que assumir a atividade criar esse hipertexto.

Sou professora de Língua Portuguesa, na Escola Municipal de Angical, nas séries finais do Ensino Fundamental, experimentei as sugestões citadas acima em uma turma de 9º ano (8ª série). A princípio, quando mencionei que o filme foi gravado no nordeste, logo uma aluna comentou, filme brasileiro e gravado no nordeste, não presta. Essa opinião foi o ponto de partida para as questões relacionadas à identidade e identificação. O trailer e as resenhas os ajudaram a levantar algumas hipóteses sobre o filme, tramitar um pouco por tempos paralelos e espaços diferentes. Discutimos o contexto histórico, a linguagem fílmica e a estrutura do gênero textual resenha. Nas resenhas que produziram a maioria concluíram que é um bom filme para estudarem os conteúdos escolares, mas que não assistiriam por lazer, acharam monótono, porém contraditoriamente, reflexivo.

O filme pode até não dá conta de abarcar essa gama de conteúdos, no primeiro momento, nas atividades escolares. Entretanto se conseguir sensibilizar o olhar desses jovens telespectadores em relação a nossa realidade, já é um grande feito, que certamente enobrecerá a produção fictícia do cineasta Marcelo Rocha.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

V Evento Cultural de Angical X Oficina de Áudio

Há cinco anos que o Colégio Municipal de Angical realiza eventos culturais em praça pública. Os alunos apresentam as atividades realizadas em sala de aula orientadas pelos professores, os quais fazem um breve relato da atividade realizada para o público. Cada noite é encerrada as atividades com uma atração musical com artistas da região. No primeiro dia, deste ano, tivemos a presença dos cursista de música da UFBA. Foi um Show!
Apresentei com os meus alunos, dos anos 6 e 7, um recital de poesias. Com os alunos do ano 8 produzi o texto da vinheta para anunciar em um carro de som, o evento para a comunidade . Uma aluna foi eleita pela turma para gravar. A oficina de áudio veio na hora certa, tivemos o apoio do Ponto de Cultura, onde gravamos e editamos a vinheta. Foi uma senção muito boa participar em todas as etapas, Contei com a parceria com as colegas Francinete e Clébia na edição.
A vinheta cumpriu seu proposto... tivemos um bom público... o evento já virou tradição para a comunidade de Angical.



Exposição das Produções Artísticas





No dia 08/10/09, aconteceu a exposição das produções artísticas no Auditório da UFBA, foi um show de criatividade, orientado pela professora Giovana Dantas.
Além do meu ensaio fotográfico da caatinga, o colega apresentou um ensaio com personagens ilustres da cidade. Terra virou textura, tinta (imagem 1)... Revelaram-se verdadeiros artistas!

Produções Artísticas




INFÂNCIA


O cheiro, as cores, os sons... A caatinga é um cenário perfeito para aguçar os nossos sentidos e apurar a sensibilidade humana - o berço do homem sertanejo, que passa despercebido ao olhar cotidiano, sofrido com a seca e embaçado pela poeira.

Cresci ouvindo meus pais e avós falarem da beleza da caatinga, mas parecia que existiam dois mundos diferentes, outras pessoas falavam dessa mesma caatinga como um lugar cor de cinza, sem vida. Além disso, era como se a caatinga só existe lá na roça, na reserva. Demorou até compreender que toda a vegetação que me cercava era a caatinga; preferi vê-la com os olhos que encantavam meu imaginário na infância.

A primeira vez que fiz uma excursão em uma reserva de caatinga foi numa Escola de Técnicas Agrícola de Irecê – ESAGRI. Nunca mais olhei o trajeto entre a cidade e a vila que moro – Angical – com os mesmos olhos. São 12 km de estrada de chão, outrora asfalto, ladeada no inverno por belos são joeiros floridos, acompanhados por alguns mandacarus e barrigudas alvinhas, dentre roças de milho, feijão, mamona e até girassol. Na estiagem a paisagem verde – amarela, dar lugar a outra paisagem cinzenta, das árvores secas, alternadas com cactos verdes.

Recentemente fiz outra excursão ecológica, desta feita, para uma reserva de caatinga que fica de fronte a escola que leciono, na própria comunidade em que resido, conhecida por todos como Manguinha. Na semana seguinte participei da oficina de Criações Artística, na UFBA, na qual a orientadora Giovana Dantas, artista plástica, nos propôs um projeto de criatividade. Naquele dia a volta para casa deveria ser investigativa, além de observar, fomos incentivados a fazer o registro da paisagem.

Saí tão apressada do encontro, para pegar o ônibus, que acabei esquecendo do dever de casa. Na manhã seguinte, sentei num dos bancos do jardim da faculdade, aguardando o horário da aula, quando percebi um besouro tentado desvirar de posição, se equilibrar e pegar vôou. Lamentei não estar com a câmera fotográfica, ao lembrar de uma foto espetacular que fiz de uma abelhinha tirando o néctar de uma flor, na última excursão que fiz.

Só ao entrar na sala me dei conta do meu esquecimento. Alguns colegas já tinham projeto e até Diário de Bordo escrito. Outra colega falou da ladeira, popularmente conhecida como Cansa Jegue, no caminho de Irecê a Angical. Minha memória foi acionada, conduzido me a beleza da caatinga que me acompanha naquele mesmo caminho. Juntando as experiências já citadas, logo fiz um recorte mental e meu projeto estava encaminhado – um ensaio fotográfico na/da caatinga.

Fiz uma retrospectiva de tudo que marcou minha infância: os buzos que viravam bois, as árvores com seus mais deliciosos frutos, umbuzeiros, quixabeiras e juazeiros. Outras plantinhas que só alimentavam os pássaros e as crianças, outras só serviam para brincar, comidinha de boneca ou colocava na palma das mãos só para pipocar. Os mais ousados se divertiam colocando armadilhas para aprisionar os pássaros, ou com um estilingue, para matá-los. Só não valia essa vadiação na semana santa.

Aproveitei o feriado para retornar a Manguinha com alguns amigos, foi como mexer num baú, inclusive encontrei ervas que curaram meus resfriados de infância e o pião que fazia as crianças se livrarem das verrugas. Na trilha que seguimos, havia uma quixabeira que nos convidou a um acampamento. Não estávamos preparados para tanto, mas fizemos um piquenique, acompanhado de muitas histórias de infância.

O cheiro da natureza, com diversas essências, as cores com várias nuances, acompanhados de um fundo musical que é uma verdadeira sinfonia, é um convite ao retorno...